“...uma coisa sei: eu era cego e agora vejo!”
João 9:25 (NVI)
Existem duas verdades axiomáticas, de caráter imutável e
permanente: primeiro, que Jesus conhece todos os tempos e então não se angustia
com o futuro, pois para Ele o tempo está numa mesma perspectiva temporal.
Segundo, que os seres humanos não conhecem os tempos e então vivem a se
angustiar com o futuro, pois para estes o tempo é um algoz imprevisível. Para
nós, seres desdivinizados (neologismo possível para descortinar a humanidade de
homens), só nos resta acordar, dia a pós dia, com a certeza de que “futuro é
uma astronave que tentamos pilotar. Não tem tempo nem piedade nem tem hora de
chegar. Sem pedir licença muda nossa vida. Depois convida a rir ou chorar. Nessa
estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá. O fim dela ninguém sabe bem ao
certo onde vai dar (...)” - trecho da canção “Aquarela”, de Toquinho, Álbum
Aquarela, 1983. E, é exatamente neste hiato silencioso entre presente e futuro
que o Carpinteiro esculpe Suas obras de arte na história, às vezes, assumindo
um agradável sorriso temporal, outras tantas, personificando a emoção
indecifrável das tristezas atemporais - sendo nesta última que pessoas ficam
tatuadas em nossas vidas, pois “o valor das coisas não está no tempo que elas
duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos
inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis” (frase atribuída,
sem comprovação, a Fernando Pessoa).
No caminhar de Jesus pela história registra-se um diálogo
silencioso com um cego de nascença (cf.
Jo. 9) – digo diálogo silencioso, pois Jesus só conversa com o referido cego
tempos depois, num segundo encontro (vs.
35 ao 38), sendo aqui Jesus reconhecido pelo cego. Contudo, antes deste
discurso ser verbalizado já havia diálogos
entre estes dois personagens, não no campo
cego da humanidade, mas sim no campo da infinitude do Mestre. Para o cego
aquele dia era apenas mais um de vários outros de completa desesperança,
conformidade com as limitações e aceitação das deformidades. Entretanto, sendo
o Carpinteiro conhecedor de todos os dias, já tinha agendado desde antes do
cego nascer, aquele encontro. Então, enquanto os homens tentam explicar as
coisas da vida, se achando conhecedores das causas (vs. 2), Jesus descortina os intentos superiores dAquele que
subsiste acima da linha do tempo e interfere (dialoga) na história (vs. 6 e 7). Para o Criador os
significados e significantes não existem somente nas palavras/conversas, os
diálogos ocupam dimensões extra-temporais, não explicadas por nossa pequenez,
porém percebida/recebidas por nossa miserabilidade. Como propõem John Pipper
(“Sorriso escondido de Deus”, Shedd Publicações, 2002) ao descrever as
intervenções e intenções de Deus na história de personagens do cristianismo
recente, demonstrando que existe um sorriso escondido (silencioso) de Deus que
se dialoga com as incompreensíveis aflições humanas. Assim como endossa Ron
Mehl (“Deus trabalha no turno da noite”, Editora Quadrangular, 1994) quando
descreve o cuidado de Deus para com a história humana, desnudando que nossas
vidas não estão isoladamente desgovernadas, mas sim são regidas por Aquele que detém
todo o poder para mudar situações catastróficas e que escolhe surpreender o homo sapiens com o inexplicável.
O constrangedor em todo este discurso é que podemos ficar encantado com a
pasmalidade temporal de “uma coisa sei: eu era cego e agora vejo!” (cf. Jo. 9:25) e, então, nos esquecermos
do outro lado da história humana em que temos de admitir, de tempos em tempos,
que “o Senhor o deu, o Senhor o levou; louvado seja o nome do Senhor” (cf. Jó 1:21). Aqui é preciso reiterar
que a galeria dos heróis da fé (cf.
Hb. 11) não fora dada aos que encontraram livramento, mas sim os que“...morreram
sem receber o que tinha sido prometido (...) Alguns foram torturados (...)
Outros enfrentaram zombaria e açoites, outros ainda foram acorrentados e
colocados na prisão, apedrejados, serrados ao meio, postos à prova, mortos ao
fio da espada. Andaram errantes, vestidos de pele de ovelhas e de cabras,
necessitados, afligidos e maltratados” (cf.
Hb. 11:13, 35, 36, 37). Jesus conhece todos os tempos, e para não nos bestificar a semelhança
dos amigos de Jó, prefiro seguir minha jornada nesta terra sem entender os
tempos, porém, crendo que Ele pode me curar das várias cegueiras que me
assombram, entretanto, nunca saberei se é hoje o dia deste nosso diálogo.
Enquanto isto, desfruto de meus dessabores existenciais crendo que nenhum dia
se passa sem que Ele reja, com estrema maestria, a história de seres miseráveis
como eu. Ao final, nosso diálogo está sendo narrado, e quer seja nesta vida, ou
ao encerra-la, teremos todas as lágrimas enxugadas, e a tristeza não mais
haverá, e então, como que num sussurro esperançoso (coisas do Carpinteiro),
poderemos ouvir: “estou fazendo novas todas as coisas...” (cf. Ap. 21:4-5).
Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
_______________________________
Artigo escrito em: 30 de Abril de 2014
Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 30 de Abril de 2014
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