"Procura apresentar-te a Deus aprovado, como
obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade.
Mas evita os falatórios profanos, porque produzirão maior impiedade. E a
palavra desses roerá como gangrena; entre os quais são Himeneu e Fileto; Os
quais se desviaram da verdade, dizendo que a ressurreição era já feita, e
perverteram a fé de alguns. Todavia o fundamento de Deus fica firme, tendo este
selo: O Senhor conhece os que são seus, e qualquer que profere o nome de Cristo
aparte-se da iniqüidade”.
II Timóteo 2:15-19 (ACF)
O título deste artigo é propositalmente polêmico a fim de atrair
para uma inquietante conversa dois
grupos incomunicáveis que coexistem na Lavoura de Deus. De um lado, os que
entendem que o estudo teológico prejudica a fé das pessoas e as tornam mais frias na igreja, para estes “teologia é
do Capeta”; do outro lado do ringue
estão os teólogos, que defendem ter na teologia a cura para o câncer eclesiástico que corrói as doutrinas bíblicas,
para estes “teologia é de Deus”. Esta tentativa de dialética que se desdobrará
nas linhas que se seguirão pode ser útil para entender as razões e os porquês
de a teologia ser objeto de ódio para alguns e de esperança para outros. A
rotulação simplista de categorizar “do Capeta” ou “de Deus” não é suficiente
para saciar a dúvida dos muitos evangélicos que povoam as igrejas tupiniquins. É preciso ir além, é necessário por um lado,
sair da superficialidade determinista e do legalismo autocrático; e é
necessário por outro lado sair do tecnicismo teórico e do superego do saber.
Teologia é do Capeta! Esta exclamação é pertinente quando se senta
ao lado de pastores que tiveram suas igrejas dilaceradas por grupos de teólogos
(e/ou seminaristas) que, no ímpeto de propagar as novas descobertas acerca do
Evangelho em suas comunidades locais, se esqueceram de que enfiar guéla abaixo alimento sólido em quem só comia papinha é provocar reações tipo: rejeição, indigestão, quando não
engasga e sufoca. Estes teólogos da
indigestão se esquecem de que há tempo para tudo nesta terra (cf. Ec. 3), tempo inclusive para
desconstruir heresias e tempo para construir o alicerce para o entendimento da
verdade. É, portanto, passivo de compreensão quando se escuta pastores
afirmarem serem contra o estudo teológico, pois uma teologia que não é capaz de produzir edificação aos cristãos e
nem responder aos anseios sociais dos que os rodeiam não poderia ser chamada de
teologia.
Teologia é do Capeta! É mais real
para alguns líderes eclesiásticos acreditarem nesta proposição do que
admitirem ser a teologia algo de Deus, pois alguns estudiosos da Bíblia se esquecem de que mais importante que saber o
que é certo, é fazer o que é certo. Tristemente, há aqueles que são amantes do
discurso, são estes os que têm solução para todos os problemas da igreja na
pós-modernidade, mas nunca fazem nada em suas igrejas locais; são estes os que
se sentam em suas cátedras teológicas e dali desmerece o esforço dos
missionários/evangelistas que foram para as periferias, mas jamais ousaram
sujar seus sapatos anunciando o evangelho aos pobres; são estes os que apontam
o dedo, mas encolhem a mão. Por isto, não é mais tão estranho quando se ouve
alguns grupos cristãos se
posicionarem contra os teólogos afirmando serem estes os precursores da Besta, pois afinal de contas, as pessoas
escutam mais o que fazemos do que o que falamos.
Teologia é do Capeta! Enfim, há alguns que preferem acreditar em
tal alínea não por causa dos maus exemplos de alguns teólogos ou seminaristas,
mas sim porque historicamente um povo sem instrução é mais fácil de ser
manipulado. Para alguns mercenários da fé
o fato de proibir os membros de estudar teologia é a maneira ideal de fazê-los
não conhecerem a Verdade e viverem assim dependentes das pregações dominicais e
da (des)orientação pastoral. Neste ambiente alienado uma afirmação do tipo,
“teologia é do Capeta”, proferido pelo ditador
eclesiástico é absorvida de forma plena, irrevogável e irracional pelas
massas evangelicais. Para estes donos
de igrejas a demonização dos cursos
de teologia é a fuga perfeita para evitar pessoas críticas que não tolerarão a
barganha espiritual e nem cederão ao canto
da sereia dos que usam a igreja como meio de corrupção sacerdotal. A
assombrosa realidade é que algumas igrejas se tornaram o ponto de encontro de
pessoas que rejeitam suas faculdades intelectuais por erroneamente julgarem
isto contrário ao pressuposto da fé, estes se tornam presas vulneráveis aos abutres da fé que se deliciam com o
cheiro fétido da carniça eclesiástica.
Teologia é do Capeta? É no mínimo antagônico e completamente
contrário admitir que o estudo teológico seja obra do Diabo, pois em linhas
gerais a teologia é a ciência que se
ocupa do estudo acerca de Deus e da sua relação com a criação. Como, então,
poderia ser isto fruto do Maligno? O estudante da bíblia é por essência alguém
com profunda sede de Deus e com demasiado interesse de melhor servi-lO na
fraternidade da Igreja; estes são pessoas que escolheram atender o chamado de
Deus e sendo assim intencionalmente optaram em se oporem ao mundo e seus
prazeres a fim de honrar o Criador com suas vidas de forma racional e
espiritual; estes são aqueles que sentiram tamanho constrangimento frente à
obra salvífica de Cristo no Gólgota que não lhes restou outra resposta a não
ser ofertar suas próprias vidas a fim de conhecer
(leia-se interagir, imergir) mais dEle com o propósito único de agradá-lO,
honrá-lO e reverenciá-lO.
Teologia é do Capeta? Como poderia ser, se a figura do teólogo é
algo análogo à figura do apologista (defensor da fé) tão fortemente destacado
no contexto do Novo Testamento. Ser teólogo é engrossar a fileira dos que lutam
pela fé evangélica (cf. Fp. 1:27) e
fazem de seus discursos uma afronta aos que querem usar do Evangelho como fonte
de enriquecimento em detrimento da boa fé
dos fiéis; ser teólogo é ter a coragem de criticar os movimentos megalomaníacos que engorduram as
estratégias de liderança para o crescimento de igrejas sem levar em
consideração a genuína conversão como fator primordial para o ingresso destes
na comunidade batismal. Ser teólogo é ousar não se calar frente às injustiças sociais
provocadas pela sociedade capitalista, bem como pelas igrejas capitalistas, que insistem em usar do Evangelho como fonte
de discriminação, racismo, preconceitos e demonização
das classes sociais menos favorecidas.
Teologia é do Capeta? Definitivamente não é! Contudo, alguns por
falta de conhecimento de causa são
tendenciosamente levados a acreditar nesta mentira do Capeta. Alguns preferem endiabrar os teólogos, pois na verdade
querem rejeitar o estudo (i.e.
pensar), pois acreditam em uma fé subjetiva, mística e empírica, assim,
encontram uma irracional religiosidade
que configura no caminho perfeito para fugir da responsabilidade, da
consciência e do raciocínio. O desafio do cristão é estar “...sempre preparado
para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da
esperança que há em vós...” – I Pe. 3:15. O texto é sumariamente importante,
pois enfatiza a necessidade de se estar preparado,
de ser capaz de responder com temor
aos que questionam sobre a fé, e de estar apto a argumentar acerca da razão da esperança que fundamenta a
crença. Postulados estes que só serão adquiridos por meio de uma metodologia
intencional de estudo, mediante a dedicação acadêmica e de esmero na
interpretação bíblica. É exatamente para isto que existem os seminários
teológicos, ou seja, para formar cristãos que sejam teólogos, preparando-os
para os desafios do presente século.
A igreja brasileira precisa urgentemente voltar a estudar a
Palavra de Deus antes que seja tarde demais e cheguem dias em que os tupiniquins serão destruídos pela ira de
Deus e os nossos sacerdotes serão
rejeitados pelo Dono das Ovelhas (cf.
Ez. 34). Algo muito semelhante com o que houve no contexto de Oséias: “O meu
povo foi destruído, porque lhe faltou o conhecimento; porque tu rejeitaste o
conhecimento, também eu te rejeitarei, para que não sejas sacerdote diante de
mim; e, visto que te esqueceste da lei do teu Deus, também eu me esquecerei de
teus filhos” – Os. 4:6. Então, o assustador/temor não é admitir, erroneamente, que teologia é do Capeta, mas sim que
teologia é de Deus, pois sendo assim reportaremos nossa consciência, nossos
discursos e nossas vidas a Ele, e “horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo”
– Hb. 10:31. Por isto, para ser teólogo é necessário mais que aptidão
acadêmica, é imprescindível ter reverência; é necessário mais que boa oratória,
é imperativo vivenciar a Palavra; é necessário mais que a crítica, é mister se
autocriticar; é necessário mais que discussões sobre Deus, é preciso
conhecê-lO.
Então, “teologizai-vos”.
Fortalecido pela
cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br
Artigo escrito em: 30 de Março de 2011
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