"Portanto, se
alguém está em Cristo, é nova criação. As coisas antigas já passaram; eis que
surgiram coisas novas! Portanto, somos embaixadores de Cristo, como se Deus
estivesse fazendo o seu apelo por nosso intermédio. Por amor a Cristo lhes
suplicamos: Reconciliem-se com Deus".
2 Coríntios 5:17,20 (NVI)
2 Coríntios 5:17,20 (NVI)
Desde mui
pequeno somos ensinados a fazer o certo, mas pouco se ensina sobre sermos
certos. A preocupação central está na ação de fazer e nada tem haver com a
essência de se ser. Deste dualismo épico que se digladia em nossas histórias é
que surge a lacuna pseudo-ética de fazer o que não se é, criando um habitat
para viver de aparências, nutrindo-se de falsidades, e regozijando-se na irrepreensibilidade
do que é feito. Quando focamos em ações facilmente nos esquecemos da
natureza/essência, dai elogiamos quem deveria ser repreendido, exortamos
aqueles que estão lutando contra os pecados invisíveis e exoneramos aqueles que
incansavelmente insistem em não ser algo que não são. No contexto pós-moderno
estes abutres da visibilidade se encontram numa perspectiva instável, pois o
fazer certo não é mais algo estático, mas sim mutável, dependendo então dos
interesses, da tribo, da época, dos sentimentos, da mídia, enfim... fazer o
certo neste mundo torna-se uma tarefa exaustiva e inconclusa – as aparências
dependem dos espelhos que a refletem.
Quando se
faz o que é certo tende-se a receber estímulos externos que corroboram para a
continuidade desta ação, pouco se preocupa com a intenção, motivação ou razão
de se fazer. Quando se faz o certo apenas se escuta os aplausos, abafando a
suave voz da consciência que questiona quem somos. Tal cenário é antagônico
quando a ação é rotulada de errada, neste contexto cria-se várias homílias que
tentam engenhosamente explicar (ou pelo menos justificar) o porquê de não se
fazer outra vez a ação errada. Quando erramos as pessoas a nossa volta tentam
nos convencer que isto não é coerente com quem somos, associando
perceptivelmente a ação à essência. Por esta razão o problema em questão neste
artigo não são as ações erradas, pois estas recebem atenção adequada
relacionando o fazer ao ser. O grande vilão está trajado de ações corretas,
pois estas tendem a surrupiar a dignidade inglória e entronizar reis indignos.
É estranho perceber que na sociedade hodierna o erro diz respeito ao nosso
caráter e, bizarramente, o acerto nada tem paralelo com nossas virtudes. É por
este vácuo de percepção que surge o “certo errado”.
O erro
sempre fará parte de nossas vivências, pois é isto que caracteriza uma
sociedade ativa. O terrível é perscrutar o disfarce do erro que paulatinamente
vem agregando vestimentas de acerto para fugir das exortações e receber congratulações.
Então, é possível fazer tudo certo e ser completamente errado. Arriscaremos
alguns exemplos: quando um artista milionário doa parte de sua riqueza para um projeto social na África subsaariana
esta seria uma ação certa, mas o que se percebe é que atualmente ajudar os
miseráveis dá status e prestígio, então, o que era para ser uma boa ação na
verdade escondia uma má intenção – é o “certo errado”. Quando um político ajuda
uma comunidade carente esta seria uma ação certa, mas o que se percebe é que o
tal político quer apenas se reeleger e para isto precisa das massas pobres,
então, é o “certo errado”. Quando uma pessoa faz obra de caridade é sempre
visto como uma boa ação, mas o que se percebe é que num Brasil cada vez mais
Espírita fazer caridade nada tem haver com o próximo, mas sim com a premissa
condicional da salvação partir da caridade e da preocupação individualista da
evolução do espírito – novamente é o “certo errado”.
Nas sombras da
lenda de Robin Hood alguns poderiam argumentar ser louvável a atitude de fazer
o bem pouco se importando se os meios são errados. É exatamente esta
argumentação que esconde o que verdadeiramente deveríamos questionar: caráter/essência.
Enquanto focarmos nas ações e suas funcionalidades, pouca atenção restará para
avaliarmos quem realmente somos. Num mundo de marionetes do bem e espectadores
do certo não resta espaço para ser, pois os holofotes estão sempre sobre o
fazer. Então, tristemente, o que fazemos pode não ter nada haver com que somos.
Esta é a razão do porque existem tantos religiosos que aprenderam a ter
atitudes cristãs, mas não se tornaram cristãos. Vão à igreja e ouvem que
precisam amar o próximo, perdoar, tolerar as fraquezas de outrem, congregar,
doar a si mesmo, falar de Jesus, e tantas outras coisas certas, mas... se
esquecem que todas estas virtudes anteriores perdem o valor se estes não tiverem
vivido o “nascer de novo” (cf. Gl.
6:15; Jo. 3:3,7; 2Co. 5:17), é necessário que a natureza de Cristo revista
nossa antiga natureza.
Ao contrário
do que se escuta pelos rincões igrejeiros tupiniquins
há algo mais importante que ter atitudes cristãs, é imprescindível que sejamos
cristãos. Caso contrário ouviremos a horrenda sentença: "Nem todo aquele
que me diz: ‘Senhor, Senhor’, entrará no Reino dos céus, mas apenas aquele que
faz a vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: ‘Senhor, Senhor,
não profetizamos nós em teu nome? Em teu nome não expulsamos demônios e não
realizamos muitos milagres?’ Então eu lhes direi claramente: ‘Nunca os conheci.
Afastem-se de mim vocês, que praticam o mal!’" - Mt 7:21-23 (NVI). Por isto, fazer o certo não
é suficiente para o Reino, pois o Senhor consegue ver quem somos, Ele “não vê
como o homem: o homem vê a aparência, mas o Senhor vê o coração" - 1 Sm.
16:7 (NVI). Até podemos viver uma vida similar aos preceitos cristãos, mas isto
não garante que sejamos cristãos. Os que entendem o cristianismo como uma fórmula
de perfeição e acertos não entendeu a essência. Ser cristão não é acertar
sempre, mas se arrepender sempre que necessário; ser cristão não exclui
deslizes infantis na vida adulta, mas inclui a graça e a misericórdia na
jornada cotidiana; ser cristão não é garantia de sucessos e aplausos, mas sim a
convicção de que o Senhor é o dono da história e nada foge do controle dEle.
Por tudo isto, ratifica-se que o mais importante não é fazer, mas ser – por
isto é necessário “nascer de novo”.
O “certo
errado” pode agregar inúmeras outras formas que desafortunadamente desnudaria uma
incompatibilidade entre o fazer cristianismo
e o ser cristão, basta um exercício de autocrítica para descortinar a raiz do
que estamos fazendo. Rotular e categorizar o certo pelo simples fato do que é perceptível
em ação não é a forma mais correta, de semelhante maneira classificar o errado pelos
critérios da visibilidade é entrar em um solo escorregadio que pode aniquilar boas
intenções que tiveram maus resultados. Enfim, é preciso contradizer o velho
ditado popular que ousa afirmar: “de boas intenções o inferno está cheio” – na verdade
o inferno está cheio de pessoas que tentaram parecer boas, mas que em suas
intenções eram más. Os resultados não revelam intenções, os acertos não
denunciam finalidades e a popularidade do certo não convence corruptivelmente a
essência do erro. Por tudo que fora exposto é válido ratificar, que
indubitavelmente, não resta outro caminho para ser, é necessário “nascer de
novo”. E é ali que aprenderemos com erros e não seremos encantados com os
acertos.
Fortalecido pela
cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br
Artigo escrito em: 18 de Abril de 2013
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