"Irmãos, sigam unidos o meu exemplo e observem os que vivem de acordo com o padrão que lhes apresentamos. Pois, como já lhes disse repetidas vezes, e agora repito com lágrimas, há muitos que vivem como inimigos da cruz de Cristo”.
Filipenses 3:17-18 (NVI)
A quase espontânea capacidade de incriminar
alguém é proporcional ao interesse de outro em se safar de um erro, pois quando
se culpa alguém os olhos se voltam para o acusado, não para o acusador. Por
esta razão um dos mais inquietantes discursos de Jesus Cristo foi acerca da
hábil facilidade do ser humano de estender o braço e erguer o dedo indicador
para outrem e culpá-lo de algo. Isto fica notório em Mateus 7:3: “E por que
reparas tu no argueiro que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que
está no teu olho?”. Observe que Jesus repreende os fariseus não por terem a
capacidade de apontar as falhas alheias, mas sim de serem incapazes de observar
seus próprios desacertos. Portanto, o cerne da questão não é o motivo do
julgamento, mas sim as vivências de quem está julgando.
O erro dos fariseus não era o fato de acusar,
mas sim o de não terem capacidade de praticar o que acusavam. Isto fica explícito
no texto de Mateus 23:4:
“Pois atam fardos pesados e difíceis de suportar, e os põem aos ombros dos
homens; eles (fariseus), porém, nem
com o dedo querem movê-los” – destaque do
autor. Por esta razão Jesus adverte os fariseus: “Não julgueis, para que
não sejais julgados” - Mateus 7:1.
Ao contrário do que se diz por ai, Jesus não queria recriminar o fato de se
julgar, mas sim a incompatibilidade prática (ações/obras) daqueles que acusam. Por
isto os fariseus seriam julgados, por não viverem aquilo que exigiam dos
outros. Em concordância a este postulado o versículo subseqüente afirma: “Porque
com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes
medido vos hão de medir a vós” - Mateus 7:2.
A inquietante advertência de Cristo aos
fariseus se resume da seguinte maneira: antes de apontar os erros de alguém
atente primeiramente se você está praticando o que exige dos outros, pois é
isto que igualmente exigirão de você. Portanto, o conceito de “fariseu” não é sinônimo
de acusador (julgar), mas é aplicável para com aqueles que culpam os outros de
algo que ele próprio não vive. Então, contextualizando, pode-se afirmar que nas
vivências eclesiásticas a história farisaica se repete, pois há muitos que
impõem aos demais diversas obrigações sem que os mesmos as pratiquem. A
semelhança dos fariseus, muitos cristãos tem se munido de belos discursos
espirituosos e de um puritanismo desmedido, pois assim podem se esconder atrás
de suas vidas inglórias e culpar outros pelos seus fracassos ministeriais.
Os fariseus pós-modernos se mostram nas
igrejas evangélicas estampando uma superioridade espiritual inatingível, pois
assim evitam que outros julguem na medida em que estes estão julgando – já que
no ambiente eclesiástico as pessoas tem medo de julgar os “espirituais”
(leia-se lideres religiosos, semelhantes ao “encargo” de fariseus nos tempos
bíblicos). Estes confundem (de forma intencionalmente) o termo insubmissão com o conceito de contestação. Segundo os dicionários o
termo “insubmisso” se refere a alguém que seja altivo e independente.
Contrariamente, o termo “contestação” se refere à capacidade de negar a
rigorosidade de alguém. Por tanto, não é insubmissão questionar aqueles que
estão nos pedestais exigindo algo das massas, é contestação – isto é bom para o
cristianismo, mas ruim para os fariseus.
Os fariseus dos tempos contemporâneos gostam
de apontar inúmeras falhas eclesiásticas, são capazes de propor muitas
estratégias evangelísticas, se alegram com sugestões inovadoras para o culto e
se rejubilam com o fato de poderem fazer melhor do que já é feito. Entretanto,
estes são incapazes de colocar em prática a menor das homilias – por esta razão
são fariseus. Devido à presença indiscutível dos fariseus no seio das igrejas é
que, por fim, se aprende a não mais dar tanto valor para o que as pessoas dizem,
e então, se aprende a arte de escutar o que as pessoas fazem. Esta é a gritante
diferença entre fariseus e cristãos, o primeiro se limita ao falar, o segundo
se satisfaz em fazer.
Os fariseus eclesiais da atualidade sempre
tendem a ter “dois pesos e duas medidas” – sobre os outros é pesado, sobre si
próprio é leve. Portanto, é válido relembrar o poema: “Quando outra pessoa não faz algo, é preguiçosa; quando eu
não faço, estou ocupado. | Quando outra pessoa reclama, é intrigante; quando eu
falo, é crítica construtiva. | Quando uma pessoa teima, é cabeça-dura; quando
eu faço, estou sendo firme e coerente. | Quando outra pessoa fala de si mesma,
é egocêntrica; quando falo, preciso desabafar. | Quando outra pessoa encara os
dois lados do problema, é indeciso e fraco; quando eu o faço, sou compreensivo.
| Quando outra pessoa faz algo sem ordem superior, estava excedendo suas
funções; quando eu o faço, é iniciativa” – texto
de autor anônimo.
Enquanto as igrejas ainda continuarem sendo o
recôndito para os fariseus, então, a frase de Margaret Mead (antropóloga, 1901-1978) continuará a
ecoar: “O que as pessoas dizem, o que
as pessoas fazem e o que elas dizem que fazem, são coisas inteiramente
diferentes”. Portanto, a igreja evangélica brasileira precisa de cristãos que
ousem questionar (julgar) sem medo de igualmente serem julgados na mesma
medida; cristãos que não sejam espirituosos, mas sim espirituais, ao ponto de
entenderem que são seres humanos passivos de erros; cristãos pensadores que
ousem romper a medíocre linha do discurso e arrisquem sofrer as conseqüências do fazer.
Por fim, é válido criar um diálogo entre dois
grandes pensadores ativistas, Martin Luther King (1929-1968), que afirma: “O
que mais preocupa não é o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos,
dos sem-caráter, dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons”. E, Edmund Burke (1920-2001), que
completa: “Ninguém comete erro maior
do que não fazer nada porque só podia fazer pouco”.
Fortalecido pela
cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br
Artigo escrito em: 23 de Fevereiro de 2010
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